Nascida em Sorocaba, cidade do interior de São Paulo, a atriz
Eliane Giardini tem um bom motivo para comemorar o sucesso de sua personagem na novela das 21h,
O Outro Lado do Paraíso, da
Globo.
Nádia tinha tudo para ser rejeitada pelo público, afinal tem tudo o que
se combate em uma pessoa. É racista, fútil, adora as propinas recebidas
pelo marido, Gustavo, trata mal os empregados. Ela reúne todas as
‘qualidades’ para ser odiada pelo público. Mas não é o que a atriz
percebe. “Ela foi aceita e não rejeitada, era um grande risco fazer uma
personagem assim, que fala coisas absurdas”, afirma.
Com a
aceitação, Nádia entra para o rol de vilãs de telenovela que, apesar de
praticar a maldade, caem nas graças do público por conta da força
interpretativa das atrizes. É o caso de
Renata Sorrah que, em
Senhora do Destino(2004), construiu uma Nazaré preconceituosa, imoral e violenta. Ou
Adriana Esteves como Carminha, em
Avenida Brasil(2012), mulher inescrupulosa a ponto de tentar enterrar a filha viva.
Com
Nádia, o autor Walcyr Carrasco trata de um tema atual: o racismo.
“Procuro conscientizar as pessoas daquele racismo que é o mais comum no
Brasil, o racismo velado, que não bate, mas ofende e trata o semelhante
como um ser inferior”, comentou ele, em sua conta no Instagram.
De fato, em
O Outro Lado do Paraíso,
Eliane vive com o marido, interpretado por Luis Melo, um juiz nada
honesto da cidade de Palmas, que adora quebrar o galho dos amigos e, em
troca, recebe malas de dinheiro, além dos filhos Bruno (Caio Paduan) e
Diego (Arthur Aguiar). Entre as amigas, estão Sophia Aguiar (
Marieta Severo)
e Lorena (Sandra Corvelone), que, assim como Nádia, não enxergam nada
além do que lhes pode render dividendos. “Essas pessoas não se veem
assim porque vivem em uma bolha, entre pessoas iguais”, raciocina
Eliane. “Vivem fechadas em condomínios, frequentam os mesmos lugares e
não enxergam a realidades dos outros.”
Logo
no começo da trama, a socialite Nádia mostra a que veio. Em sua casa,
trabalhava Raquel (Erika Januza), que ouviu coisas absurdas da patroa
por ser pobre, negra e ainda morar em um quilombo. Pior, o filho Bruno
se apaixona por ela. Claro que a mãe consegue separar os dois. Mas a
grande reviravolta é que a humilde garota consegue se formar e agora é
uma reconhecida e honesta juíza na mesma cidade. “Você não pode imaginar
como dói em mim (fazer essas cenas) – eu tinha medo de que as pessoas
confundissem a atriz com a personagem, mas isso não aconteceu”, conta.
“Tenho 30 anos de personagens simpáticos, amorosos e isso conta também.
Não fui rejeitada, ainda bem, acho que não estava preparada para isso.”
“Os
filhos, geralmente, trazem ares novos. Ao se apaixonar por uma juíza
correta, que luta contra corrupção e preconceitos, o filho, que é
delegado, começa a ver com mais clareza as falcatruas dos pais. Por
causa da Raquel, ele passa a ver os pais de outra forma”, comenta ainda
Eliane.
Segundo
a atriz, Nádia quer mostrar que o que faz “vem de berço”. “São pessoas
educadas dessa forma e vão passar isso para os filhos”, afirma. “Daí,
uma pessoa que vem com olhar de fora percebe o grotesco que é a
situação, mas eles não – está tudo certo: as propinas que recebem vêm em
nome da amizade, liberar uma pessoa da prisão em nome da amizade.
Afinal, amigo serve para isso, para facilitar, cortar caminho. É
exatamente nesse tipo de bolha que minha personagem reside.”
A
novela, que é recheada de personagens de caráter duvidoso, teve um
início pesado, com cenas de agressão, estupro, mas, em seguida, a trama
ficou menos truculenta. É um dos motivos que explicam o aumento do
índice de audiência, chegando a bater recorde.
“Todos os
personagens da novela refletem os problemas atuais da humanidade”,
observa Eliane. “É o caso de Sophia, uma verdadeira psicopata, e o filho
Gael (
Sérgio Guizé),
que bate na mulher. Tenho muita pena desses personagens, os filhos da
Sophia são pessoas boas, mas absolutamente estragadas”, diz a atriz,
explicando que isso se deve ao fato de a mãe ter criado os filhos sem
amor e ensinado a eles que o dinheiro compra tudo.
Como em toda trama, principalmente das 21 horas, a de
O Outro Lado do Paraíso
lida com diversos assuntos espinhosos. “A novela tem um cardápio bem
variado de temas, mas isso é bom, isso liberta, ajuda todas essas
causas. A gente vive um tempo muito complicado, mas todo mundo está
debatendo, é um tempo importante que estamos vivendo”, garante ela.
Mas
Eliane Giardini tem também cenas mais leves, que acontecem
principalmente quando está entre quatro paredes com o marido. Em
diversas oportunidades, o público se diverte com ela realizando
fantasias dele, como quando se veste de enfermeira, policial, odalisca
ou Marilyn Monroe. “Por incrível que pareça, é uma família disfuncional,
mas existe afeto ali. Por isso, acredito que ainda há esperança, pela
capacidade que eles têm de se amar”, ressalta.
As vilãs ocupam um lugar de honra na dramaturgia
Luiz Zanin Oricchio
Como
mexe com a emoção do público, a obra precisa ter a quem amar e a quem
odiar. Uma ficção só de sentimentos positivos seria um porre. Uma só com
gente baixo astral, idem. O ideal é a mistura balanceada e é isso que
os roteiristas buscam. Heróis carismáticos contracenando com vilões
fortes.
Muitas vilãs ficaram famosas na história do cinema. São milhares, mas como esquecer Alex Forrest (
Glenn Close), de
Atração Fatal, pesadelo para o homem casado que pula a cerca? Ou a maquiavélica editora de moda Miranda Priestly (
Meryl Streep), de O Diabo Veste Prada?
Mas se for para eleger um clássico da vilania,
O Que Terá Acontecido a Baby Jane? figura na ponta da lista. A campeã seria
Bette Davis
no papel da atriz frustrada e envelhecida que atormenta a irmã
paraplégica (Joan Crawford), chegando ao requinte de servir-lhe um rato
na refeição!
A relação de ódio entre as duas saía da ficção e
avançava pela vida real. Tanto assim que viraram personagens da ótima
minissérie em oito capítulos Feud:
Bette and Joan, exibida na Fox. A série tem por centro justamente a filmagem de
Baby Jane,
dirigida em 1962 por Robert Aldrich. O set era um campo de batalha onde
os egos duelavam a cada dia. A rixa entre as divas, já enorme em si,
era ainda estimulada pelo diretor, a mando do produtor, o mitológico
Jack Warner (Stanley Tucci).
Na concepção de Warner, barracos
entre atrizes atiçam a curiosidade mórbida do público e geram mais
bilheteria para o filme. Este sim era um vilão de almanaque, porém
agindo nos bastidores.
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